31 de março de 2010
30 de março de 2010
29 de março de 2010
Não quero ser o último a comer-te.
Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde
em minha boca seca de querer-te,
de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde
a esperar que limpasse toda a gala
que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intata, renascida,
para travar comigo a luta extrema
que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema.
28 de março de 2010
27 de março de 2010
No corpo feminino, esse retiro
- a doce bunda - é ainda o que prefiro.
A ela, meu mais íntimo suspiro,
pois tanto mais a apalpo quanto a miro.
Que tanto mais a quero, se me firo
em unhas protestantes, e respiro
a brisa dos planetas, no seu giro
lento, violento... Então, se ponho e tiro
a mão em concha - a mão, sábio papiro,
iluminando o gozo, qual lampiro,
ou se, dessedentado, já me estiro
me penso, me restauro, me confiro,
o sentimento da morte eis que adquiro:
de rola, a bunda torna-se vampiro.
25 de março de 2010
Sob o chuveiro amar, sabão e beijos,
ou na banheira amar, de água vestidos,
amor escorregante, foge, prende-se,
torna a fugir, água nos olhos, bocas,
dança, navegação, mergulha, chuva,
essa espuma nos ventres, a brancura
triangular do sexo - é água, esperma.
é amor se esvaindo, ou nos tornamos fonte?
24 de março de 2010
23 de março de 2010
22 de março de 2010
De todos os pássaros, os beija-flores são os que mais me fascinam. Suas cores brilhantes: verde, azul, preto. Nunca vi mas sei que alguns têm cores vermelhas. Flutuam no espaço como nenhum outro pássaro, suas asas batendo com uma velocidade tal que as torna invisíveis. E a velocidade do seu vôo: pairam no ar, imóveis, sugando a flor. De repente transformam-se em flechas que disparam pelo ar. Vivem do mel das flores. Enfiam seu bico fálico no orifício vaginal das flores, suas pequenas línguas saem e sugam o néctar doce.
Foi assim a primeira vez: como o beijo manso e inofensivo de um beija-flor. Você sentiu sua língua doce entrando no seu corpo. De repente tudo ficou colorido, brilhante, leve. Alegre. Como se você estivesse sendo tocado pelos deuses. Que bom se a vida fosse sempre assim!
O beija-flor se foi e sua vida voltou ao que era, o cotidiano de sempre que lhe parecia bobo e sem sentido. A vida ficava muito mais bonita com o beijo do beija-flor! O beija-flor voltou. Você ficou alegre. A experiência se repetiu. Você pediu que ele lhe enfiasse seu fino bico como da primeira vez. Esses beija-flores sempre obedecem. Você não percebeu que a lingüinha do beija-flor estava um pouquinho maior, entrava mais fundo em você. Mas, que importância tinha isso diante da alegria que o beija-flor lhe trazia?
Aí o beija-flor se transformou no seu pássaro encantado. Você pensava nele durante a sua ausência e sua vida passou a ser uma espera do seu retorno.
Cada vez que ele voltava sua língua ficava um pouco maior. Ia mais fundo. Dividiu-se em várias. Passou a entrar em muitas direções do seu corpo e da sua alma ao mesmo tempo. O beija-flor já não era o passarinho inofensivo do primeiro dia. Cresceu. Você percebeu que havia garras nos seus pés. E havia anzóis em suas línguas. Você começou a querer livrar-se dele. Mas ele já havia cavado buracos profundos no seu corpo e na sua alma. Na ausência do beija-flor esses buracos doíam com uma dor insuportável. Mas ele sempre voltava - tão diferente! - e fazia a dor passar. Agora o que o ligava ao beija-flor não mais era o prazer do primeiro dia. Era o prazer (tolo) de ver a dor passar.
A mitologia Grega conta de um herói, Prometeu. Prometeu desafiou os deuses, roubou o fogo e deu-o aos homens. Como castigo ele foi acorrentado numa rocha e um abutre vinha diariamente comer um pedaço do seu fígado.
Prometeu é você. O beija-flor o enganou. Disse-lhe que era possível ter a felicidade dos deuses sem fazer esforço: bastava aceitar o seu beijo. Você - menino bobão - acreditou. Agora você está acorrentado num rochedo. Você já notou que o beija-flor deixou de ser um beija-flor? Que ele se transformou num abutre? Vá diante de um espelho. Olhe-se com atenção. Veja a que lixo você foi reduzido!
O caminho em que você está tem apenas três fins possíveis.
O primeiro deles, o melhor, o que tem menos sofrimento, é a morte.
Ah! Ellis Regina! Você cantava tão bonito! Alegria para tanta gente! Mas as alegrias comuns da vida não lhe bastaram! Você queria alegrias maiores! Afinal de contas, os artistas bem que a merecem! Não sei se foi acidente ou se foi de propósito. O fato é que o beija-flor a matou.
Ah! Chet Baker! Você não sabe quem é Chet Baker? Aconselho-o a ir a uma loja de CDs e procurar por ele. Você vai ouvir o pistão mais veludo, mais suave, mais triste, mais bonito que você já ouviu. Que felicidade poder tocar pistão daquele jeito! Que felicidade ser amado do jeito como ele era, pela música que ele fazia. Mas ele não suportou as exigências do beija-flor que já havia se apossado do seu corpo. Incapaz de quebrar as correntes, ele achou que o único caminho era morrer. Somente a morte colocaria um fim ao seu sofrimento. A morte, freqüentemente, é a única saída.
O outro caminho é a loucura. O seu "hardware" e o seu "software" não agüentam a luta e você enlouquece. Será que há situações em que a pessoa deseja ficar louca? Sei que há situações em que a gente deseja ficar doente. Doente, a gente deixa de ter responsabilidades. Os outros cuidam da gente. Se você ficar louco não adianta o beija-flor vir. Os outros não vão deixar que ele entre. Dói muito a princípio. Se você não estivesse louco você deixaria que o abutre comesse mais um pedaço do seu fígado. Mas você está louco. Os médicos e enfermeiros o defendem.
O último caminho, eu acho, é o mais terrível. Por causa do beija-flor-abutre você é capaz de fazer qualquer coisa. E você vai entrando cada vez mais fundo num mundo sinistro e escuro do qual é muito difícil sair. Até que você comete um crime que o levará à prisão. Aí você passará a sua vida atrás das grades, no meio de criminosos cruéis - e você nem imagina a que humilhações você será submetido.
Essa carta, eu a escrevo admitindo a hipótese de que você queira quebrar as correntes. Se você não quer nem precisa continuar a ler. Será uma perda de tempo.
Há uma coisa que recebe o nome de "síndrome de abstinência": ela é a dor que se sente na ausência do beija-flor-abutre. É dor física, é ansiedade, é angústia, é pânico, é desespero - tudo junto. Para se livrar dessa dor você será capaz de fazer qualquer coisa: você perde a razão. Aí, para que você não faça essa "qualquer coisa", pessoas que o amam - se é que elas existem - tomam uma providência: internam você numa clínica. Internação em clínica é um artifício de força a que se recorre para impedir que você faça a tal "qualquer coisa", na esperança de que, depois de muito sofrimento, a dor vá passando e as correntes fiquem mais fracas. De fato, com o tempo, as dores passam. Como passam também as dores que se tem quando uma pessoa querida morre. Com uma diferença: quem sofre a perda de uma pessoa amada sabe que não há nada que se possa fazer para que ela volte. Então, ela nem tenta. Convive com a sua dor. Não há outra alternativa.
Mas esse não é o seu caso. O buraco parou de doer. Mas ele continua lá. Continuam as memórias das experiências divinas. E as memórias tentam. Ah! Como tentam! E você diz: "Já estou livre! Só uma vez! Só uma última vez, vez de despedida. Não haverá outra..."
Jesus era sábio. Conhecia as armadilhas da alma. Contou uma parábola, a estória de uma casa onde morava um demônio. Aí o dono da casa ficou cheio com o demônio e o pôs para fora. Vazia a casa, ele a varreu, pintou e decorou. Mas ficou vazia. Passados uns dias o tal demônio, vagando pelas redondezas, passou pela casa onde morara e se surpreendeu: "Vazia! Ainda não tem morador!" Foi, chamou outros sete demônios e se alojaram na casa. Jesus termina a parábola dizendo que o estado da casa ficou então pior do que era antes. Os demônios moram no Vazio.
Passadas as dores da "síndrome de abstinência" o seu maior inimigo será o Vazio. Como diziam os filósofos antigos, a natureza não suporta o vazio. O vácuo "chupa" o que está ao seu redor. Com o que concordam os que conhecem a alma: o Vazio é o lugar preferido dos demônios. Esta é a razão por que os místicos iam para o deserto, onde não havia ninguém. Não para ter paz. Mas para medir forças com os demônios. "E Jesus foi levado pelo Espírito ao deserto para ser testado pelo demônio."
Agora, que você está livre da "síndrome de abstinência", trate de encher o seu Vazio. Se você não o encher os demônios voltarão.
Pra lidar com o Vazio nada melhor que trabalho corporal, braçal. As atividades intelectuais e espirituais, que eu tanto amo, podem ser perigosas. Leitura, poesia, meditação, são remédios fracos. Fracos porque eles são vizinhos do mundo do beija-flor. Atividades intelectuais e espirituais freqüentemente têm efeitos parecidos com os das drogas. Marx estava certo quando comparou a religião ao ópio. Freud estava certo quando se referiu ao poder inebriante da música. Inebriante: que nos torna ébrios...
Aconselho que você se empregue numa oficina mecânica, numa construtora, como auxiliar de pedreiro, numa madeireira, numa carpintaria, como agricultor, como jardineiro, como enfermeiro, como lixeiro. Será inútil que você se dedique aos seus próprios hobbies. Você precisa de alguém, ligado aos trabalhos corporais, que saiba da sua situação, e que o aceite como aprendiz.
E é preciso não estar sozinho. Batalha que se batalha sozinho é batalha perdida. Batalha que se batalha com outros é batalha que pode ser ganha. Os AA sabem disso. Os Vigilantes do Peso sabem disso.
A vida, com todas as suas limitações e frustrações, merece ser vivida. Às margens do caminho esburacado há morangos que podem ser colhidos e comidos. Trate de viver. Trate de comer os morangos. Esforce-se por ser feliz!
Minhas netas: O mundo de quando eu era criança era tão diferente do mundo em que vocês e eu vivemos agora que parece que ele aconteceu há muito, muito tempo mesmo, no tempo daquelas estórias antigas que começavam sempre assim: "Era uma vez, numa terra distante, há muito tempo atrás..." Será que eu vivi no tempo do "era uma vez"? A nossa viagem na minha máquina de tempo nos fez viajar 62 anos na direção do passado, quando eu era um menino de 5 anos. Vocês vão dizer: "Mas vovô, 62 anos é muito tempo mesmo! Você viveu no tempo do era uma vez!" Vocês são crianças de 10, 11 anos de idade. 62 anos é, para vocês, muito tempo, um tempo que vocês nem podem imaginar. Quando eu tinha a idade de vocês eu sentia do mesmo jeito. Mas não é muito tempo quando pensamos nos milhares de anos, nas centenas de milhares de anos que medem o tempo em que os nossos antepassados começaram a povoar o mundo.
Vocês já ouviram falar sobre eles na escola, os homens pré-históricos, o homem de Neandertal... Pois eu vou dizer uma coisa muito esquisita: eu acho que o mundo em que eu vivia estava mais próximo do mundo desses nossos antepassados, há milhares de anos, que do mundo de vocês, o mundo em que nós vivemos! É que, no passado, o tempo andava muito devagar, porque as mudanças aconteciam muito devagar. Vocês podem imaginar quantas centenas de anos levou para que os homens descobrissem a maneira de produzir fogo? Ou o tempo que levou para que eles aprendessem a fazer cerâmica? Durante milhares de anos os homens só usavam instrumentos de madeira e de pedra. Podem imaginar o tempo que se passou até que eles descobrissem os metais - e mais - o tempo que se passou até que eles aprendessem a usar os metais? Para usar metais, para transformar os metais em ferramentas, eles tinham de já dominar a tecnologia do fogo - porque é preciso fogo para fundir os metais. E qual teria sido o acidente que fez com que eles descobrissem que os metais, colocados no fogo, a altas temperaturas, derretiam? Que momento extraordinário deve ter sido aquele quando um homem, pela primeira vez, produziu uma lâmina afiada que podia cortar o couro, cortar a madeira, cavar a terra! Os seus companheiros devem ter olhado para ele com assombro, respeito - quase como se ele fosse um deus!
Quando as mudanças acontecem muito devagar o tempo anda muito devagar. Ao contrário, quando as mudanças acontecem depressa, o tempo anda depressa. E foi isso que aconteceu: desde que eu nasci as mudanças começaram a acontecer de maneira cada vez mais rápida. E a razão por que as mudanças passaram a acontecer de forma cada vez mais rápida se deve a isso: antes as descobertas aconteciam por acidente. Mas, de repente, os homens aprenderam a fazer as mudanças de propósito. Não precisavam esperar que acidentes acontecessem. Aprenderam que, usando o pensamento, eles podiam fazer as coisas que desejavam. No lugar/tempo da minha infância as mudanças andavam de carro de boi. No nosso tempo as mudanças andam de avião a jato! A distância que um avião a jato percorre em uma hora, um carro de boi, andando sem parar, dia e noite, levaria 270 horas para percorrer! Assim, eu posso dizer que o mundo em que eu vivia quando menino de 5 anos estava mais próximo do mundo dos nossos antepassados que do mundo em que vivemos agora. Em 62 anos o mundo experimentou mais transformações - voou mais - que durante todos os milhares de anos passados em que nossos ancestrais viveram!
Eu vivi, assim, muito perto do início da história do homem! O jeito como as coisas eram feitas no meu tempo de menino era o mesmo jeito pelo qual elas eram feitas muitos séculos antes. Vou dar um exemplo. No meu tempo de menino a gente fazia sabão em casa. Para isso se usava sebo de vaca e um líquido preto que era obtido fazendo filtrar água através da cinza. Faz alguns anos visitei, nos Estados Unidos, uma aldeia que é uma réplica (réplica = cópia) de uma das aldeias onde viviam os primeiros norte-americanos, nos séculos XVI e XVII. Pois encontrei, num canto da aldeia, o lugar onde eles faziam sabão com a descrição de como eles o faziam. Pois eles faziam sabão do mesmo jeito como se fazia na minha casa! Então era como se eu, há 62 anos, vivesse no mesmo tempo em que viveram os tais norte-americanos, 400 anos antes!
No meu mundo a gente vivia perto do nascimento do coisas. Vou explicar. Veja o caso do fogo, sobre que já falamos. Na minha infância o fogo tinha que renascer a cada manhã. Ele nunca estava pronto. A dona de casa que, de manhã, tirava as brasas de sob a cinza e arranjava os paus, os gravetos, os pauzinhos e o capim em volta e sobre as brasas, estava fazendo o fogo nascer. Porque as brasas não são fogo. Não produzem chamas. São fracas demais para cozinhar. As brasas são apenas sementes de fogo que podem virar fogo se houver alguém que saiba como incendiá-las! E a dona de casa então soprava as brasas para que o capim se incendiasse, e o capim incendiado acendesse os pauzinhos que, por sua vez, acenderiam os paus! Quando isso acontecia era uma alegria. O fogo nascia porque ela sabia fazê-lo nascer! Ela conhecia os seus segredos! Aquela mulher era uma parteira do fogo!
Nas casas de hoje o fogo já aparece pronto. Não é preciso saber coisa alguma do mistério do seu nascimento. A gente torce um botão e aperta outro: o fogão a gás se acende. Basta apertar um botão do isqueiro para que o fogo apareça. A gente esfrega o fósforo na lixa ao lado da caixa e o pauzinho pega fogo. O fogo já vem pronto. A gente nunca vê o fogo sendo parido pela arte de uma pessoa.
Nunca vi uma criança assentada quieta olhando o fogo de um fogão a gás. Fogo de fogão a gás não tem graça. Mas vejo vocês, crianças, olhando, fascinadas, o fogo da fogueira, o fogo do fogão de lenha, o fogo da lareira! Por que será? Vocês têm uma explicação?
E a água? A água, nas nossas casas, não tem mistério. A gente abre a torneira e a água sai. Ou vai ao supermercado e compra água engarrafada. Olhem agora, a minha casa de pau-a-pique e fogão de lenha: onde estão as torneiras? Não há torneiras! Se não há torneiras, como é que a gente vai ter água? Se a gente quisesse ter água a gente tinha de ir até o lugar onde a água nascia! Pois a água nasce! Nasce de dentro da terra. O nosso corpo está cheio de veias. Nas veias corre o sangue. Quando a gente corta um dedo, o sangue jorra. Pois a terra é igual ao nosso corpo. Dentro dela há veias. Dentro das veias da terra corre a água: os veios d'água! A água é o sangue da terra. É a água que faz a terra viver. O lugar onde as veias da terra são cortadas e a água jorra se chama mina. Na mina a gente vê a água saindo de dentro da terra. Na mina a gente vê a água nascendo. Vocês já viram uma mina? Já viram a água nascendo? Não. Vocês nunca viram a água nascendo. O que vocês vêem é a água saindo da torneira, a água dentro da garrafa. Água sem mistério! Porque quando a gente olha para a mina, e vê a água saindo de dentro da terra, a gente sente que está diante de um milagre. Se vocês quiserem ver um milagre acontecendo, tratem de procurar uma mina...
A água saindo de dentro da terra vai, aos poucos, cavando um buraco à sua volta. Como se fosse uma bacia. Nessa bacia se acumula a água pura, cristalina, transparente, fresca. Olhando lá no fundo e gente vê o lugar exato onde a água sai de dentro da terra. Coisa parecida com uma erupção vulcânica: erupção de água. E nesse lugar onde a água jorra, as areinhas são jogadas para cima. À volta da mina tudo é vida, tudo é verde. Terra e água fazem vida. Crescem as avencas, crescem samambaias, crescem plantas de todos os tipos. E se a gente está com sede, é só fazer as mãos em concha, mergulhar na água da mina, pegar a água e beber. É impossível beber água numa mina sem ter pensamentos de gratidão por haver na natureza coisa tão bela.
Meu pai trabalhava no campo. Com foice e enxada. O sol era forte. O corpo coberto de suor. Ficava com sede. Pensava na mina. Mas não ia beber. Trabalhava mais. Queria ficar com mais sede. E aí, quando a sede era insuportável, ele ia para a beirada da mina, e bebia a água friinha... Ele me contou que isso, ele, com sede insuportável, bebendo a água da mina, era uma das maiores felicidades de que ele se recordava, em toda a sua vida... É preciso que vocês dêem um jeito de conhecer uma mina. Eu juro: uma mina é uma coisa mais maravilhosa que tudo aquilo que vocês possam ver num Playcenter. A água nascendo...A vida nascendo...A natureza nascendo. Pois, se vocês não o sabem, é nas minas que a natureza nasce...
Desejo dar-lhe um estranho conselho, um conselho que nunca imaginei que um dia eu fosse dar. Esse é o conselho: Se a sua cozinheira tiver o costume de cantar enquanto cozinha, não permita. Cozinheiras que cantam em serviço podem, um dia, se transformar num imenso problema para você, com conseqüências financeiras inimagináveis... Se você acha que perdi o juízo, espere um pouco e você compreenderá.
As explicações, freqüentemente, começam muito longe... Começo com uma conversa entre dois jagunços do Grande Sertão - Veredas, do Guimarães Rosa. Um deles confidencia ao seu companheiro: "Matar eu mato. Mas nunca fico com raiva..." O seu colega, duro de entendimento por lhe faltarem sutilezas psicológicas, não entende e pede explicação. O outro responde curto e grosso: "Quem fica com raiva leva o outro para a cama." Eu já disse que o ódio gruda mais que o amor. Você está amando... O amor é feliz, cheio de memórias bonitas. Você vai para a cama e dorme sorrindo. E sonha... Mas aí acontece algo, alguém lhe faz uma coisa que lhe dá muita raiva. A raiva toma conta de tudo, sentimentos e pensamentos. Não o deixa. Sua vontade é gritar, bater, destruir. É hora de dormir. Seus olhos estão pesados. Você quer dormir. Mas a raiva não o deixa. Você vai para a cama e ao seu lado se deita... a pessoa de quem você está com raiva. Você quer pensar coisas bonitas, quer pensar na pessoa amada. Mas aquela pessoa, ao lado, não deixa...
Pois é isso que está acontecendo comigo. Estou com muita raiva. E, por causa da raiva, estou levando para a minha cama um garçom que se diz cantor. E, ao meu lado, ele canta valsas do Sílvio Caldas...
Tive um restaurante, o Dali Restaurante-Bar. Quando sonhei o Dali, tudo era alegria: as fontes, as árvores, os jardins, os quadros, os drinks, a comida, os amigos reunidos e a música. Sim, música. Sem a menor vergonha digo que tínhamos ali os melhores músicos de Campinas. Jamais aceitamos a idéia de ter música de segunda classe, para economizar. Os sonhos são assim: neles só o que é bom aparece. Os problemas surgem quando se tenta transformar o sonho em realidade.
Antes de continuar preciso fazer uma confissão. Sou um mau psicanalista. Talvez seja bom no consultório. Mas quando estou solto na vida a virtude que marca a arte da psicanálise me abandona. A psicanálise é uma arte perversa. Ela se baseia na desconfiança. Não acredita nas aparências. Vê um sorriso e logo pergunta: "Que coisas sinistras esse sorriso está escondendo?" Bachelard chegou a descrever um psicanalista como uma pessoa que, quando se lhe dão uma flor, logo pergunta: "Mas onde está o estrume?"
Sou mau psicanalista porque tenho a tendência de acreditar no rosto (me esquecendo de que um rosto é sempre uma máscara...). Foi assim que fui me relacionando com os funcionários do Dali, os garçons, os bar-men, os músicos, os cozinheiros, os ajudantes de cozinha. Eu achava que eram meus amigos. Todos sorriam para mim. Paguei muito caro a minha ingenuidade. Há rostos sorridentes onde se escondem cobras. Descobri, na minha pele, que a realidade não é a amizade. É aquilo a que Marx deu o nome de "luta de classes". A lição de política que não aprendi na universidade fui aprender pelo sofrimento no Dali...
O fato era que eu me comportava como um "paizão". Quem me pôs esse apelido foi o Edemilson, pedreiro que construiu o Dali e que sempre me foi leal. Queria ajudar a todos. Nos apertos todos me procuravam. E eu sempre dava um jeito.
Pois apareceu lá no Dali um garçom pedindo emprego. Era um homem de meia idade, estatura mediana, fala mansa, rosto triste, desempregado, pai de filhos. Fiquei com pena dele. E não só isso: gostei dele. Suas maneiras eram refinadas, o que revelava algo de suas origens. De fato, nas suas origens estava algo diferente. Ele não fora sempre um garçom. Um dia ele me mostrou um disco de vinil. Na capa, uma fotografia dele, jovem. Fora cantor. Fiquei com dó. Quem, um dia, gravou um disco, sonhou em ser grande cantor. Sonhou com palcos, shows, fama, dinheiro. Quem sabe, um dia, ele seria como Roberto Carlos. E vou batizá-lo de Roberto Carlos porque não posso dizer o seu nome verdadeiro. ele apareceu com um daqueles discos antigos de vinil. Mas ele não conseguiu ser cantor. Fracassou. Restou-lhe ser garçom. Olhava para aquele homem triste de fala mansa atendendo os clientes e me comovia, pensando que dentro dele havia um cantor estrangulado. E até lhe emprestei R$500,00 para fazer face a uma emergência, uma cirurgia de hemorróidas, coisa muito doída. E foi assim que, movido por compaixão, uma noite em que estava alegre, disse aos meus músicos, profissionais de primeira: "Se não for criar problema para vocês, deixem o Roberto Carlos cantar alguma coisa. Ele vai ficar feliz. Parece que ele canta músicas dos tempos do Sílvio Caldas..." E foi o que aconteceu. Para o Roberto Carlos foi a glória. De vez em quando os músicos lhe davam uma colher de chá. Fiquei com tanto dó dele que pedi ao pessoal do Correio Popular que escrevesse algo sobre ele. O que aconteceu. (Mal sabia que esse gesto de generosidade seria usado por ele para me apunhalar...)
Mas aí aconteceu o que sempre acontece em restaurantes: invejas entre os funcionários, brigas, desentendimentos. Havia um bar-man complicado, sistemático, de difícil relacionamento. A equipe embirrou com ele. "Paizão", entrei em cena para acalmar a família. Reuni os funcionários, inclusive o dito bar-man. Conversei com eles. Pedi diálogo e paciência. Terminada minha curta fala dei oportunidade para que quem quisesse falar falasse. E foi assim que eles, timidamente, começaram a articular suas queixas com o bar-man, que a tudo ouvia com absoluta elegância. Foi então que, de repente, rompendo o clima existente, houve uma explosão. O Roberto Carlos parecia possuído por um demônio. Começou a gritar, a dizer palavrões ao bar-man, terminando por ameaçá-lo de agressão física. Levei um susto. Ordenei que o Roberto Carlos se calasse. Foi como se eu não existisse. Repeti minha ordem uma, duas, três vezes, inutilmente. Então, diante desse desrespeito público à minha autoridade de patrão e da possibilidade de agressão, eu lhe disse: "Levante-se, recolha suas coisas e se vá. Você está despedido."
Um caso claro de demissão por justa causa. Mas, para isso, seria preciso que os funcionários testemunhassem perante o juiz. Mas ninguém quis. Funcionários de restaurante não testemunham contra colegas, a favor do patrão. Antes da verdade e da justiça, os interesses da classe. Conformei-me, então, em pagar os direitos que a Justiça do Trabalho determina. Mas eu não estava preparado para o que se seguiu. Ele, através do seu advogado (sem quem não se faz justiça), além dos direitos de garçom, pedia que ele fosse indenizado como "cantor do restaurante". E uma das peças do processo, prova contra mim, foi a tal reportagem que fiz publicar no Correio Popular, porque tive pena dele. Assim, estou me tornando um melhor psicanalista. Olhando para os olhos de pomba, fico preparado porque sei que lá dentro está aninhada uma cobra com bote armado. O juiz já deu a sentença. Segundo a sentença eu fui injusto. Não paguei ao artista Roberto Carlos aquilo que deveria ter pago - cantor que ele era. Já fiz o depósito de R$3.000,00, para ter direito a recorrer. Vocês não imaginam a raiva que dá ter de tirar um dinheiro ajuntado para pagar a mentira de um mentiroso. Por isso não estou conseguindo dormir. Fico rolando com o Roberto Carlos, ouvindo o Sílvio Caldas...
Compreendem, agora, porque não se deve deixar a cozinheira cantar em serviço? Porque pode ser que, ingressando em juízo, ela alegue que, além de cozinhar, ela era "artista em residência". O Roberto Carlos fez isso comigo. O que é que vai impedir que sua cozinheira faça o mesmo com você? Lembre-se de que as coisas mais inocentes podem, em juízo, ser invocadas como provas contra você.
17 de março de 2010
Um grupo de amigos de 40 anos discutiam e discutiam para escolher o restaurante onde iriam encontrar-se para jantar. Finalmente decidiram-se pelo Restaurante do Velho Mikão porque as garçonetes usavam mini-saias e blusas muito decotadas.
10 anos mais tarde, aos 50 anos, o grupo reuniu-se novamente e mais uma vez discutiram e discutiram para escolher o restaurante. Finalmente decidiram-se pelo Restaurante do Velho Mikão porque a comida era razoável e tinha vinhos de colônia.
10 anos mais tarde, aos 60 anos, o grupo reuniu-se novamente e mais uma vez discutiram e discutiram para escolher o restaurante. Finalmente decidiram-se pelo Restaurante do Velho Mikão porque ali tinha toalhas plásticas nas mesas, música suave e sala de fumadores.
10 anos mais tarde, aos 70 anos, o grupo reuniu-se novamente e mais uma vez discutiram e discutiram para escolher o restaurante. Finalmente decidiram-se pelo Restaurante do Velho Mikão porque lá havia uma rampa para cadeiras de rodas, agarradores nos WC e fraldário.
10 anos mais tarde, aos 80 anos, o grupo reuniu-se novamente e mais uma vez discutiram e discutiram para escolher o restaurante. Finalmente decidiram-se pelo Restaurante do Velho Mikão. Todos acharam que era uma grande idéia porque nunca lá tinham estado antes.
16 de março de 2010
Antigamente, no Brasil, para se ter melado, os escravos colocavam o caldo da cana-de-açúcar em um tacho e levavam ao fogo. Não podiam parar de mexer
até que uma consistência cremosa surgisse.
Porém um dia, cansados de tanto mexer e com serviços ainda por terminar, os escravos simplesmente pararam e o melado desandou.
O que fazer agora? A saída que encontraram foi guardar o melado longe das vistas do feitor.
No dia seguinte, encontraram o melado azedo fermentado).
Não pensaram duas vezes e misturaram o tal melado azedo com o novo e levaram os dois ao fogo.
Resultado: o "azedo" do melado antigo era álcool que aos poucos foi evaporando e formou no teto do engenho umas goteiras que pingavam constantemente.
Era a cachaça já formada que pingava. Daí o nome "PINGA".
Quando a pinga batia nas suas costas marcadas com as chibatadas dos feitores ardia muito, por isso deram o nome de "ÁGUA-ARDENTE".
Caindo em seus rostos e escorrendo até a boca, os escravos perceberam que,com a tal goteira, ficavam alegres e com vontade de dançar.
E sempre que queriam ficar alegres repetiam o processo.
15 de março de 2010
“Aprendi a querer o que Deus quer, e tudo o que quiserdes,
certamente se realizará.”
“Se, pois quiserdes colher à esquerda, semeai à direita:
meditai neste conselho que tem a aparência de um paradoxo
e que vos faz entrever um dos maiores segredos da filosofia oculta.”
Deus é o Universo, é a alma da Luz, é a verdade absoluta.
Deus é o capaz, é a razão, é o paradoxo de nossas vidas.
Temos o livre arbítrio, mas como toda regra, se tem exceções.
Somos donos do nosso destino, mas o que somos nem sempre
é o que gostaríamos de ser.
Tudo realmente está escrito nos astros e é por esta razão
que os anjos nos ajudam
a enfrentar nossas vidas, para que possamos evoluir.
O grande segredo da Magia, é o AMOR, porém é preciso distinguir
o amor que imortaliza do que mata.
Deus sempre enviou anjos à Terra, para que homens
se sintam protegidos e amados na mais remota solidão.
E o que é a solidão senão um aprendizado de elevação.
Aprendi que nada nessa vida acontece por acaso
e se o acaso ocorre, geralmente nós o procuramos.
O amor e o ódio vivem lado a lado.
Quantas vezes pedimos aos anjos
ou a Deus que nos ajude em alguma coisa?
Mas quantas vezes agradecemos pelo ar, por esse Sol,
essa terra maravilhosa que está aí, de graça?
Pela dor, aprendemos, mas pelo amor,
esquecemos de aprender ou de ensinar!
Nesse momento, coloco toda minha existência e razão de ser,
para que as pessoas possam sentir o alívio, sentir a Paz,
sentir que o material não é nada
comparado com uma alma leve, solta.
Todos os dias estamos aprendendo, vivendo e vivenciando
momentos que de repente se perdem com o passar do tempo.
Vivemos reclamando por um amor perdido,
por falta de dinheiro, por falta de CORAGEM.
Deus nos fez a Sua imagem, então,
podemos concluir que somos parte de Deus
e esse Deus está em nosso consciente.
Se sofremos, Deus sofre.
Se choramos por um amor perdido, Deus chora.
Se cruzamos os braços, Deus cruza também.
Na realidade, o que estou esclarecendo nesse momento, é que na ERA de Aquário, o nosso maior inimigo oculto, somos NÓS mesmos.
Amor não se perde, é eterno. Braços cruzados nos aleijam.
Chorar, geralmente contrai músculos e chega a envelhecer.
Covardia é Guerra perdida.
A ausência de religião hoje em dia, nos ensina erroneamente a vida, pois nos tornamos cada vez mais materialistas
e é por está razão que os Anjos chegam, para resgatar essa ausência de existência.
Temos que aprender a nos respeitar, a nos amar,
a nos influenciar por verdadeiros valores.
Anjos não tem idade, sexo, ou religião.
Eles são emissários e mensageiros de Deus.
É por intermédio deles que Deus nos ajuda.
É por intermédio deles, que evoluímos a cada vida.
Para cada dia há um Anjo e para cada Anjo há um ser.
Nesse momento, iremos entrar numa lógica do ocultismo.
Vamos verificar como e porque a sua Paz depende tanto
da sua Boa Vontade e de sua Coragem.
Gabriel, um Príncipe angelical,
avisou a Maria que ela iria Ter um filho de Deus.
Raphael e tantos outros tiveram e tem suas mensagens para nos dar.
“Temos aqui, uma megacrise e os anjos vieram para nos resgatar
e se não acreditarmos neles como expressão de “fraternidade”
tudo será aniquilado!”
Autor: Artur da Távola, escritor
Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT435457-1664,00.html
Clandestina Ed. Rocco - Rio de Janeiro, 1998