Nas primeiras horas da manhã de ontem, dezenas de pequenas gaivotas começaram a ser jogadas nas praias de Mongaguá, junto à plataforma de pesca. A maioria estava morta e as poucas que sobreviviam tentavam inutilmente vencer a maré alta e retornar a seus ninhos, na distante Ilha das Cobras. Mas seus ninhos haviam sido destruídos e elas não tinham forças suficientes para vencer as fortes ondas e voltar ao lugar de origem.
Em meio a essa luta entre a natureza e as aves, surgiu uma mulher. Uma humilde vendedora de petiscos na praia: Dona Sofia. Ela não se conformou com o espetáculo brutal e a desigualdade da luta. Mas não ficou só nisso: abandonou sua barraca, juntou-se aos filhos, enfrentou o mar bravo e começou a salvar as pequenas gaivotas, uma a uma.
Pouco depois, cerca de dez salva-vidas também se juntaram à tarefa. Por volta das 15 horas, Dona Sofia e seu pequeno exército tinham salvado mais de 500 filhotes. Poderia ter sido mais, não fossem alguns turistas que resgatavam das águas as pequenas aves para come-las.
Junto à sua barraca de petisco, Dona Sofia alimentou as avezinhas, improvisou uma estufa – puxou um fio de luz e ligou uma lâmpada – e ficou esperando ansiosamente pelo socorro pedido, ainda de manhã, à União Internacional Protetora dos Animais.
Enquanto o socorro não chegava – e já sem a colaboração dos salva-vidas e dos amigos – Dona Sofia e seus filhos continuaram espreitando o mar, numa vigília constante e aflita. A cada pequeno ponto negro que aparecia boiando, ela e seus pequenos soldados se atiravam às águas e voltavam à barraca com o sorriso dos vencedores: em suas mãos, novas pequenas aves estavam salvas. Elas as enxugava, uma a uma, colocava na estufa improvisada e voltava à vigília, pouco se importando com o movimento de seu comércio.
De vez em quando, triste, ela recolhia do imenso ninho que fizera, as pequenas gaivotas que não resistiam e as enterrava na areia da praia, como num ritual.
A noite já tinha descido em Mongaguá, os turistas já haviam retornado às suas casas, as outras barracas já tinham cerrado suas portas e uma luz ainda brilhava junto à plataforma de pesca: a que iluminava o imenso ninho que Dona Sofia fizera junto à barraca.
- Se não aparecer socorro – disse ela – vou ficar aqui a noite inteira. À noite as ratazanas e os gatos aparecem buscando comida. E eu não posso abandonar essas coitadinhas.
(Jornal da Tarde – 15 de julho de 1982)
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